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- Radyr Gonçalves –
Um bondoso e inofensivo homem escreve um poema
(Não sou eu) Não sou bondoso nem inofensivo, nem tão pouco
vou morrer no final destas letras...
Um bondoso e inofensivo homem,
Escreve de pássaros e lírios,
De canários e tardes coloridas,
Poeta corpulento, sentado na beira de um abismo,
Mirando gaviões famintos,
E naves de prata engolindo a cidade cinza,
Pensa na lira dos sessenta,
No peso de alguma falta,
Nos ratos à espreita,
No cão que rola e deita,
Na bela bem acordada que espera na calçada para o último
beijo,
Um caridoso e poético senhor,
Ingênuo, sonhador,
Escreve sobre nuvens gordas e balões de gás,
Escreve sobre a paz dos campos,
E sobre a simplicidade das camponesas,
Não há malicias nos verbos do poeta,
Não há sementes do mal, nem frutos estragados,
- Deita o obeso corpo na grama,
Sente os raios vespertinos ciciar uma benção,
Escreve no ar uma prece,
Deixa cair levemente o lápis e o papel,
O peito arde, a poesia se parte,
A dor dilacera o verso, espalha-se em cada vão do corpo,
Celebra a passagem com um místico sorriso,
A alma cala, o olhar para, a rima, a inspiração,
O pulso, o coração...
O homem está morto...
A pálida luz sépia da tarde revela um contraluz poético,
A morte curiosa recita o último poema do bondoso homem,
- É uma pena, mas parece que nunca leu sobre ácidos
graxos trans, etc...